Notícia

Tumor de ovário: nova molécula tem ação potente e seletiva

Depois de testar diversas combinações de complexos à base de platina e de paládio,  cientistas identificaram duas que, além de paládio, possuem compostos chamados tiossemicarbazonas

DivulgaçãoFreepik

Fonte

Agência FAPESP

Data

quarta-feira, 29 janeiro 2020 13:40

Áreas

Bioquímica. Oncologia. Saúde da Mulher.

Pesquisadores do Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo (IQSC-USP) e colaboradores desenvolveram um composto à base de paládio – metal branco prateado pertencente ao mesmo grupo da platina – capaz de combater células de tumor ovariano sem afetar o tecido saudável.

Nos testes feitos in vitro, com linhagens de células tumorais, a molécula mostrou ação mais seletiva e potente que a da cisplatina – fármaco mais usado hoje contra esse tipo de câncer. O novo composto mostrou-se eficaz até mesmo em linhagens tumorais resistentes à cisplatina.

O artigo, assinado por pesquisadores do Brasil, Reino Unido e Itália, foi destaque de capa da revista científica Dalton Transactions, publicado pela Royal Society of Chemistry. A pesquisa contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

“A cisplatina é um quimioterápico muito eficiente para esse tipo de tumor, que costuma ser bastante agressivo e precisa ser combatido rapidamente. No entanto, o tratamento pode apresentar efeitos colaterais muito severos, principalmente para rins, sistema nervoso e auditivo. Isso ocorre porque a molécula [cisplatina] não é muito seletiva, ou seja, afeta também células saudáveis”, explicou o Dr. Victor Marcelo Deflon, professor do IQSC-USP e coordenador do projeto.

O trabalho foi conduzido durante o doutorado de Carolina Gonçalves Oliveira, atualmente professora do Instituto de Química da Universidade Federal de Uberlândia (IQ-UFU).

Maior estabilidade

Como explicaram os pesquisadores, os compostos de paládio são metabolizados muito rapidamente no organismo humano, o que dificulta sua penetração na célula tumoral e a chegada ao alvo molecular. Para viabilizar o uso dessas substâncias no tratamento do câncer, portanto, foi preciso desenvolver moléculas mais estáveis contendo o metal.

Uma série de complexos à base de platina e de paládio foi produzida pelo grupo. Depois de testar as diversas combinações, os cientistas identificaram duas que, além de paládio, contêm compostos chamados tiossemicarbazonas, classe que promove o efeito de estabilização. Os compostos tiveram as suas estruturas químicas caracterizadas por uma técnica conhecida como difração de raios X, que consiste em observar como o material difrata a radiação emitida sobre ele.

Alguns compostos da classe das tiossemicarbazonas são conhecidos por atuar na chamada topoisomerase, enzima presente em tumores e que participa do processo de replicação do DNA – alvo potencial, portanto, para quimioterápicos.

A cisplatina, por sua vez, atua diretamente no DNA, causando mudanças estruturais no material genético que impedem a célula tumoral de copiá-lo. “São alvos diferentes, mas tanto a cisplatina quanto os compostos de paládio inibem o processo de divisão celular do tumor”, explicou o Dr. Victor Deflon.

Ação no núcleo

O complexo 1, como foi nomeada a combinação mais promissora de paládio e tiossemicarbazonas, atua diretamente na topoisomerase. Em testes realizados pelo grupo nas culturas de células tumorais, verificou-se que 70% do complexo atravessa a membrana celular em 24 horas. A maior parte se deposita no citoesqueleto – estrutura composta de diversos filamentos no interior da célula. Uma pequena parte do complexo, cerca de 3%, entra no núcleo. Entre os compostos de platina usados atualmente, uma concentração ainda menor do princípio ativo é capaz de adentrar o núcleo.

Além disso, o complexo 1 tem ação quase três vezes superior contra as células tumorais resistentes à cisplatina. Ao mesmo tempo, não afeta células saudáveis. Essa característica seletiva confere menor toxicidade à molécula, evitando os efeitos colaterais dos tratamentos atuais.

O complexo 2, por sua vez, é mais seletivo do que a cisplatina. No entanto, sua ação só é mais efetiva contra uma variedade de células tumorais também sensível à cisplatina. Esse fato sugere que o seu mecanismo de ação seja o mesmo da cisplatina, mas novos testes precisam ser feitos para comprovar essa hipótese. Além disso, apenas 18% do complexo atravessa a membrana da célula tumoral.

Os pesquisadores buscam agora desenvolver versões ainda mais eficientes do complexo 1. A ideia é obter uma molécula que possa ser testada em animais com grande chance de sucesso. Só depois de testes bem-sucedidos nesses modelos o candidato a fármaco poderia ser testado em humanos.

Acesse o artigo científico completo (em inglês).

Acesse a notícia completa na página da Agência FAPESP.

Fonte: André Julião, Agência FAPESP. Imagem: Divulgação.

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