Notícia
Líquido da casca da castanha-de-caju: aplicações vão da tecnologia ao tratamento de doenças
Constituintes do LCC são usados no desenvolvimento de sensores e dispositivos eletroquímicos e ainda no combate à leishmaniose e à dengue
Viktor Braga, UFC
Fonte
Agência UFC | Universidade Federal do Ceará
Data
quarta-feira, 28 agosto 2019 09:35
Áreas
Desenvolvimento de Fármacos. Doenças Negligenciadas. Farmacognosia. Química Medicinal.
A separação e o estudo dos constituintes do líquido da casca da castanha-de-caju (LCC) representam uma verdadeira inovação tecnológica. É nesse ponto que reside a relevância da pesquisa desenvolvida no Laboratório de Produtos e Tecnologia em Processos (LPT), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Química da Universidade Federal do Ceará.
O professor Dr. Claudenilson Clemente, um dos integrantes do LPT, dedicou-se basicamente a simular na bancada de laboratório aquilo que ocorre na natureza. Durante o mestrado e o doutorado, utilizou o cardanol, constituinte do LCC, como molécula-base para a síntese de porfirinas, macromoléculas presentes na natureza que, de forma geral, garantem a existência da vida na terra.
É o caso da clorofila, responsável por converter a energia solar, o dióxido de carbono ( CO2) e a água em carboidratos e oxigênio no processo de fotossíntese; da hemoglobina, que realiza o transporte do oxigênio no sangue; e do citocromo c, pequena proteína componente da hemoglobina associada à membrana interna da mitocôndria (estrutura responsável pela respiração celular), essencial na cadeia transportadora de elétrons. Esses sistemas podem sofrer uma série de transformações químicas cujas peculiaridades estão em suas propriedades exclusivas, possuindo, assim, variadas aplicações.
“Pensando nisso, nós utilizamos o cardanol, constituinte majoritário do LCC, na síntese dessas porfirinas. Conseguido isso, partimos para uma série de experimentos, principalmente visando imitar a natureza. Fizemos todo o estudo fotofísico delas (no qual investigamos a interação da luz com a matéria) e, a partir daí, conseguimos ter essa caracterização e dizer o potencial de aplicação como fotocatalisador”, explica o professor Clemente.
A professora Dra. Selma Elaine Mazzetto, coordenadora do laboratório, destaca que geralmente os grupos de pesquisa que trabalham com porfirina compram essas macromoléculas e fazem a modificação. No caso do LPT, o leque de aplicações se abre, já que o próprio laboratório sintetiza suas porfirinas, barateando assim o desenvolvimento do produto a ser pesquisado. “Conseguimos, digamos, 100 miligramas de porfirina por um vigésimo do preço pelo qual é vendida. Mas isso envolveu grandes esforços durante um longo período”, ressalta.
As porfirinas são utilizadas no laboratório em catálise, que é a transformação da matéria usando a menor quantidade de energia possível, com o objetivo de acelerar processos (no caso, a oxidação). Essas porfirinas dão origem a novas moléculas com grande potencial de transformações futuras. Durante o desenvolvimento de sua tese, o professor Claudenilson Clemente aplicou-as na criação de um sensor eletroquímico.
“Utilizamos uma célula eletroquímica, modificamos a superfície de um eletrodo, com o objetivo de aumentar a sensibilidade para detectar a menor quantidade possível de um fármaco na água dos nossos sistemas de abastecimento”, detalha. O trabalho foi o primeiro passo na criação de um método de purificação com grande relevância, porque medicamentos não são fáceis de ser detectados devido às quantidades irrisórias excretadas pelo corpo humano.
Tecnologia e Saúde
Na área de saúde, o doutorando Thayllan Teixeira está desenvolvendo um novo tratamento para a leishmaniose, doença tropical negligenciada, de acordo com a classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS), que afeta principalmente os mais pobres. “O Nordeste é líder em número de casos de calazar, a forma mais letal. E o Ceará possui o maior número de óbitos na região. Os casos continuam crescendo, podendo chegar a um estágio endêmico aqui”, explica. Um dos desafios do tratamento, hoje, segundo Thayllan, é o aumento da resistência do parasita causador da enfermidade, o protozoário Leishmania.
Transmitida pela picada indolor de um inseto (o flebotomíneo), a leishmaniose não tem cura, mas pode ser tratada em suas manifestações. O mosquito é menor que o da dengue, sendo difícil de ser visto e ouvido, e atua principalmente no amanhecer e no anoitecer. O ser humano está se tornando o principal hospedeiro por conta do processo de urbanização.
De acordo com o químico, outra preocupação é a coinfecção com o HIV, pois o vírus bloqueia o principal receptor do corpo capaz de combater a leishmaniose. Além disso, os medicamentos usados no tratamento da aids interagem com os da leishmaniose, reduzindo sua eficácia. E, mais uma vez, o cenário brasileiro é alarmante: o País é responsável por 93% dos casos de coinfecção com o HIV na América.
O líquido da casca da castanha-de-caju, já conhecido por sua atividade antibacteriana, antifúngica e ainda moluscicida (combate lesmas e caracóis), passou a ser testado no caso da leishmaniose. O trabalho é realizado em colaboração com a professora Dra. Jânia Teixeira, no Departamento de Patologia e Medicina Legal da UFC, onde o doutorando utiliza as culturas de Leishmania infantum, que causa a forma visceral da doença, com inchaço na barriga (aumento do baço e do fígado), e de Leishmania braziliensis, responsável pela forma cutânea, com o aparecimento de feridas no corpo.
Acesse a notícia completa na página da Agência UFC.
Fonte: Síria Mapurunga, Agência UFC. Imagem: Viktor Braga, UFC.
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