Notícia

Brasil vem sofrendo ‘apagão’ de dados genômicos do SARS-CoV-2 nos últimos meses, dizem pesquisadores

Somente 0,024% dos casos confirmados no país foram sequenciados, enquanto no Reino Unido esse índice chega a 5% e, na África do Sul, a 0,256%

Wikimedia Commons

Fonte

Agência FAPESP

Data

quinta-feira, 14 janeiro 2021 09:15

Áreas

Bioinformática. Doenças Infecciosas. Genômica. Saúde Pública.

Durante o ano de 2020, o Reino Unido liderou os esforços mundiais de vigilância genômica do novo coronavírus (SARS-CoV-2). Das 323 mil sequências publicadas até 5 de janeiro de 2021 na plataforma Gisaid, na qual cientistas de diversos países compartilham informações sobre o patógeno em tempo real, 137 mil (42%) têm origem britânica. Graças a esse esforço, foi possível identificar com relativa rapidez a emergência da nova variante B.1.1.7, considerada entre 50% e 70% mais transmissível que a originária de Wuhan, na China.

Essa nova cepa foi detectada no Brasil pela primeira vez em 31 de dezembro, por pesquisadores do Instituto de Medicina Tropical (IMT) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e da rede de laboratórios DASA, em amostras de dois pacientes com suspeita de COVID-19 atendidos em São Paulo. O trabalho de sequenciamento foi coordenado pela professora Dra. Ester Sabino.

Com essas duas novas sequências depositadas na plataforma Gisaid, o grupo da Dra. Ester Sabino atinge a marca de 600 genomas completos sequenciados. O número representa cerca de 30% das 1.828 sequências publicadas por grupos brasileiros no site.

De acordo com a pesquisadora, tal feito só foi possível graças aos recursos humanos e materiais disponíveis no Centro Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus (CADDE), projeto apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e originalmente destinado ao estudo de doenças como dengue e zika.

Os pesquisadores do CADDE avaliam, no entanto, que a situação brasileira está muito aquém da ideal no que diz respeito à vigilância genômica do SARS-CoV-2.

“O Brasil sequenciou apenas 0,024% dos casos confirmados no país [a porcentagem foi calculada com base nos dados da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos], enquanto no Reino Unido esse índice chega a 5%”, comentou Darlan Cândido, integrante do CADDE que atualmente realiza doutorado na Universidade de Oxford (Inglaterra).

Embora tenha avançado mais do que alguns vizinhos sul-americanos, como Argentina (0,003%), Colômbia (0,013%) e Venezuela (0,010%), o Brasil está atrás de outros países emergentes, entre eles Índia (0,042%), México (0,096%) e África do Sul (0,256%) – esta última já depositou quase o dobro (2.882) de sequências na plataforma Gisaid, embora o Brasil tenha uma quantidade de casos confirmados cerca de sete vezes maior.

E, como ressaltou Darlan Cândido, não se trata apenas de uma questão de quantidade. As informações brasileiras estão mal distribuídas tanto no tempo quanto no espaço. “Mais de 75% das sequências disponíveis hoje vêm da região Sudeste e isso limita muito o entendimento do que está acontecendo no restante do país. Além disso, a maior parte dos dados foi gerada no primeiro semestre de 2020. Somente 8% das sequências foram publicadas entre os meses de agosto e dezembro, tornando impossível saber, por exemplo, há quanto tempo a nova variante está circulando no país e o quão disseminada ela está”, disse o pesquisador.

O virologista Dr. Fernando Rosado Spilki, que coordena a Rede Corona-ômica – criada entre março e abril pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) para liderar os esforços de vigilância genômica no país –, admite que houve um atraso no último semestre, mas garante que um grande esforço está sendo realizado no momento para recuperar o tempo perdido.

“Boa parte das sequências publicadas no primeiro semestre foi feita com verbas de projetos sobre outros temas que já estavam vigentes e foram redirecionadas para pesquisas sobre o SARS-CoV-2. Apesar de as agências de fomento terem feito um grande esforço para liberar rapidamente mais recursos, existem entraves burocráticos que tornam esse processo demorado”, explicou o Dr. Fernando Spilki à Agência FAPESP.

Segundo o virologista, novas sequências já concluídas, ainda em processo de análise, devem ser publicadas nas plataformas internacionais muito em breve. “Após o sequenciamento há um grande trabalho de bioinformática a ser feito e isso requer uma infraestrutura computacional que não se constrói do dia para a noite. Estamos melhorando essa infraestrutura e investindo na compra de insumos. Pretendemos iniciar uma força-tarefa para sequenciar as amostras desse período que foi menos estudado [segundo semestre de 2020] e também para seguir acompanhando o que está acontecendo com o vírus agora”, disse o Dr. Fernando Spilki.

A Rede Corona-ômica conta com recursos da Financiadora de Estudos e Projeto (Finep) e congrega entidades como o Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC/RJ), o Instituto Adolfo Lutz (IAL/SP), a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz/RJ e PE), a Fundação Ezequiel Dias (Funed/MG), o Instituto Evandro Chagas (IEC/PA), a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Universidade de São Paulo (USP).

Enquanto os novos dados não forem divulgados, continuam valendo as informações publicadas pela equipe do CADDE e colaboradores na revista científica Science, em julho de 2020 (versão final do artigo foi divulgada em setembro).

“Sabemos, por enquanto, que há 38 linhagens diferentes de SARS-CoV-2 circulantes no Brasil. Aparentemente, ainda predominam as três variantes de origem europeia que emergiram em São Paulo e Rio no mês de fevereiro de 2020. Mas, como há poucos dados publicados depois de julho, é possível que isso tenha mudado”, avaliou Darlan Cândido.

Acesse a notícia completa na página da Agência FAPESP.

Fonte: Karina Toledo, Agência FAPESP. Imagem: Wikimedia Commons.

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