Notícia
Professor da UFS explica diferenças entre vacinas e estratégias de imunização da COVID-19
Dr. Diego Tanajura atua em pesquisas sobre produção e testes pré-clínicos de vacinas
Peter Ilicciev/Fiocruz
Fonte
UFS | Universidade Federal de Sergipe
Data
terça-feira, 29 dezembro 2020 08:30
Áreas
Doenças Infecciosas. Saúde Pública. Vacinas.
Você sabe quais são as principais diferenças entre as vacinas da COVID-19? E quais são as melhores estratégias de imunização da população brasileira, por exemplo? O Dr. Diego Moura Tanajura, professor do Departamento de Educação em Saúde da Universidade Federal de Sergipe (UFS), tira dúvidas sobre o assunto e afirma que a corrida em tempo recorde por uma vacina para a infecção é um capítulo nunca antes visto na história da vacinologia.
Durante o doutorado, o professor Diego Tanajura fez dois estágios nas universidades de Madrid e de Navarra, na Espanha, onde foi desenvolver novas técnicas sobre imunizantes. Ele tem experiência em testes pré-clínicos de vacinas e fármacos e produção de vacinas de ácidos nucléicos (DNA), de subunidade proteica e de microrganismos inativados.
A OMS soma, até o momento, 61 vacinas em fase clínica e 172 em estágio pré-clínico. O que explica, além de doença nova, com efeitos adversos para a saúde mundial, uma procura intensa pelo desenvolvimento de um imunizante em tempo recorde?
Dr. Diego Tanajura – É importante destacar que nunca na história da vacinologia tivemos tantos estudos voltados para o desenvolvimento de uma vacina. Na realidade, os pesquisadores que trabalham com outras vacinas acabaram direcionando seus estudos para desenvolver uma contra o novo coronavírus. E se fizermos uma comparação entre a pandemia atual e a pandemia de 2009 pelo vírus influenza da gripe, podemos observar que o impacto da pandemia atual está muito maior. Então, tudo isso, essa questão econômica, dá uma pressão muito grande na produção de uma vacina. Os investimentos para produzir um imunizante estão pesados. Por isso, a gente tem observado esse grande número de estudos. Isso já marcou a história, porque é, realmente, um momento único. Nunca vimos tantas vacinas em desenvolvimento recorde. Temos a vacina Pfizer, que em menos de dez meses, ela ficou pronta. Então tudo isso acontece por conta do poderio econômico.
Em alguns casos, como a de um novo vírus respiratório, a vacina é mais vantajosa do que um medicamento?
Dr. Diego Tanajura – A vacina acaba sendo mais vantajosa do que o medicamento, quando a gente fala de uma doença infecciosa, que a transmissão é muito fácil, como é o caso do coronavírus. Então, através da vacinação, você pode bloquear a transmissão, ou seja, frear o aumento de casos. Quando você vacina a população de maior risco, como os idosos, pessoas com alguma doença crônica, você impede a complicação da doença. E nós sabemos que a complicação da doença requer gastos mais elevados no Sistema Único de Saúde, porque muitas vezes a pessoa vai ficar internada em uma UTI por mais de cinco dias, dez dias, e o leito de UTI custa muito caro para o Estado.
Quais as vantagens da vacina em relação ao custo financeiro?
Dr. Diego Tanajura – Comparando também em termos econômicos, por exemplo, o tratamento que está em estudo através de anticorpos monoclonais custa por volta de R$6.500, sem levar em consideração os impostos. Levando para a vacina da Pfizer que custa, em média, R$100, você consegue vacinar 32 pessoas com o mesmo preço do tratamento de uma pessoa, lembrando que são duas doses a da Pfizer. E a vacina de Oxford, em parceria com a Fiocruz, você conseguiria vacinar 171 pessoas. Então, observe que até em termos econômicos a vacinação acaba sendo mais vantajosa.
Dentre as vacinas mais promissoras, como a CoronaVac, AstraZeneca e Pfizer quais são as principais diferenças em termo de plataforma e funcionamento?
Dr. Diego Tanajura – Essas três vacinas possuem plataformas e funcionamento bem diferentes. A CoronaVac, que é da empresa chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, utiliza uma das metodologias mais antigas para produzir a vacina, que é o vírus morto. Então, eles cultivam o vírus em laboratório e depois acabam inativando esses vírus. É uma estratégia muito segura. A pessoa que toma essa vacina é impossível que ela desenvolva a doença por conta da vacina, porque o vírus está morto. Por conta da sua grande segurança, ela é uma vacina que pode ser utilizada por até pessoas que têm deficiência no seu sistema imunológico. E o Butantan domina muito essa tecnologia, porque é a mesma utilizada para produzir a vacina da gripe que tomamos todos os anos. É a mesma utilizada para produzir a vacina da raiva.
Já a vacina de Oxford, da AstraZeneca em parceria com a Fiocruz, utiliza uma uma plataforma nova, a do vetor viral. Nesse caso, eles utilizam o vírus que infecta macacos, que é o que causa resfriados leves no animal, o adenovírus. Então, eles enfraquecem o vírus. E, dentro desse vírus, eles colocam a informação para que as nossas células produzam a proteína Spike, a espícula do vírus. E o sistema imune reconhece essa proteína como estranha e começa a montar as nossas defesas. Volto a ressaltar que é uma estratégia segura. Apesar de nova, já temos vacinas aprovadas com essa metodologia. A primeira vacina foi aprovada em 2019 contra o vírus ebola. Então, ela é uma estratégia segura, mas por ser o vírus vivo, enfraquecido, pessoas com deficiência no seu sistema imunológico não podem receber essa vacina.
A Pfizer foi a primeira vacina de RNA a ser aprovada para uso em humanos, mas as pessoas podem ficar tranquilas que é uma estratégia muito segura. Apesar de ter sido a primeira vacina aprovada, já é uma técnica que vem sendo estudada há mais de 30 anos. Então, a gente está vendo muita fake news sobre essa vacina: que ela poderia mudar o nosso material genético. Então, isso não acontece A vacina não vai alterar o teu material genético, não vai sair criando pessoas mutantes. Pelo contrário, é uma estratégia muito robusta. E ela levou uma eficácia de 95%. A grande vantagem dessa vacina é que você consegue produzir ela de forma muito rápida do que aquelas metodologias mais antigas que você precisa criar o vírus em laboratório, depois enfraquecer ou matar o vírus. É bom destacar que essas três estratégias que acabei falando, nenhuma delas é capaz de deixar a pessoa doente. É impossível isso acontecer.
Qual é a importância dos resultados de eficácia da Pfizer para a população idosa?
Dr. Diego Tanajura – Normalmente, a vacinação em idoso é mais complicada, porque os idosos têm imunossenescência, o envelhecimento natural do sistema imunológico. E eles respondem menos às vacinas, mas foi uma surpresa muito positiva que a vacina da Pfizer que mostrou uma eficácia de 94% na população idosa. É um resultado surpreendente.
Na sua avaliação, quais as vacinas são as mais adequadas para a estrutura da saúde do estado, e quais são os procedimentos necessários para realização de uma campanha efetiva nos 75 municípios sergipanos?
Dr. Diego Tanajura – Todas essas vacinas podem ser utilizadas no nosso estado. O que você tem que fazer é traçar estratégias para cada uma dessas vacinas. Então, o que você poderia traçar de estratégia era justamente: a Pfizer manda essas vacinas dos Estados Unidos, chega a uma base em São Paulo, onde você manda para a capital do nosso estado, tudo via malha aérea. Em, no máximo dois dias, você consegue transferir essa vacina dos Estados Unidos para Aracaju e você deveria priorizar o quê: priorizar a vacinação da região metropolitana para evitar deslocamentos longos com essa vacina, já que ela é mais sensível à variação de temperatura. Então, observe bem, com caixa de gelo seco desenvolvida pela Pfizer, você tem 15 dias para vacinar a população. Já para o interior do estado, você poderia utilizar a vacina da CoronaVac ou a de Oxford, que requerem estruturas mais simples de armazenamento: que são geladeiras convencionais, que é o que já tem nas salas de vacinas do nosso estado.
O armazenamento das vacinas é essencial para a manutenção da eficácia. Qual é a importância do acondicionamento adequado do material?
Dr. Diego Tanajura – O armazenamento é realmente algo crucial para as vacinas. Então, é muito importante você acondicioná-las e guardá-las de forma adequada. Para você ter uma ideia, quando essas vacinas são transportadas, na caixa vai um termômetro, que é justamente para sinalizar se durante o transporte dela ocorreu alguma variação de temperatura. Se essa variação de temperatura for muito grande, você pode perder o lote inteiro da vacina. Então, por isso, é crucial mesmo você acondicioná-la de forma adequada e, como exemplo, a vacina da Pfizer que tem que ser armazenada a menos 80º. Se essa temperatura variar muito, essa vacina acaba sendo degradada. Ela perde a sua eficácia.
Hoje, quais estratégias o senhor vislumbra como possíveis para aquisição de vacinas com temperaturas muito baixas, como a da Pfizer, para a realidade do sistema de saúde de Sergipe?
Dr. Diego Tanajura – A estratégia poderia partir do Ministério da Saúde. Não vejo a necessidade do nosso estado, que é um estado pequeno, investir nesses ultracongeladores. Então, o que deveria acontecer era o Ministério da Saúde investir nesses equipamentos e montar uma base no Aeroporto de Guarulhos. E de lá você distribuiria essas vacinas para todas as capitais do país através dessas caixas desenvolvidas pela Pfizer, que são caixas que você coloca gelo seco e as vacinas podem ficar ali por até 15 dias. Então, facilmente, você conseguiria distribuir essa vacina para as capitais e dava preferência para imunizar as pessoas que estão nas capitais e região metropolitana.
Como os demais planos de vacinação, é definido um público-alvo. Por que é importante uma atenção especial aos grupos prioritários, como profissionais de saúde, idosos, quilombolas e indígenas?
Dr. Diego Tanajura – Essa divisão em grupos prioritários é importante porque, infelizmente, você não tem vacina para todos neste primeiro momento. Então, tem que priorizar os grupos de riscos, que são os profissionais de saúde, que passam um tempo muito grande com as pessoas doentes, mais expostos a uma alta carga viral. Depois, nós temos os idosos. Os trabalhos têm mostrado que o idoso morre mais, idoso complica mais da doença. Temos também os quilombolas e os indígenas, que passam por vulnerabilidade social. São pessoas que têm um acesso mais restrito à saúde por conta da localidade, onde muitas vezes, fica afastada dos grandes centros. Eles têm acesso mais restrito à saúde. Quando tem acesso, é uma saúde de baixa qualidade, comparado às pessoas que vivem na cidade, por isso que deve ser dada uma atenção especial e prioridade a essas populações.
Diante de um contexto de informações falsas sobre vacinas, como os cidadãos podem se certificar da segurança e eficácia da imunização?
Dr. Diego Tanajura – É um absurdo a quantidade de notícias falsas que surgiram durante esta pandemia. E, agora, com a aprovação das primeiras vacinas, elas têm se direcionado para atacar os imunizantes. Por isso, a população tem que utilizar fontes confiáveis para se informar, como utilizar o site da Fiocruz, que está desenvolvendo vacinas, do Instituto Butantan, do Ministério da Saúde. Quando você recebe uma informação pelo Whatsapp, sempre desconfie das informações, principalmente, essas recebidas em grupos. Então, cheque essas informações e dê um Google, que você consegue verificar a veracidade delas.
Especialistas afirmam que as rotinas não voltarão ao normal imediatamente após a vacinação, ou seja, eles alertam que o processo de retomada será lento, ainda com adoção de medidas restritivas. É importante, na sua opinião, que a população compreenda essa situação?
Dr. Diego Tanajura – É importante que a população tenha consciência que o processo de retomada será lento. A gente vai continuar adotando medidas restritivas, justamente, porque a gente não vai conseguir vacinar toda a população no próximo ano. A gente só vai conseguir terminar de vacinar a população, segundo o Plano Nacional, em 2022. Não tem vacina para todos. Então, a gente não vai conseguir, de imediato, parar a transmissão do vírus.
Acesse a notícia completa na página da UFS.
Fonte: Abel Victor e Josafá Neto, Rádio UFS. Imagem: Peter Ilicciev/Fiocruz.
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