Notícia

Bactérias multirresistentes são identificadas fora do ambiente hospitalar

Análise do perfil genético de microrganismos isolados de pessoas com infecção urinária na região de Ribeirão Preto revelou alto grau de resistência e virulência; superbactéria KPC estava presente nas amostras

Dr. André Pitondo Silva

Fonte

Agência Fapesp

Data

sexta-feira, 23 agosto 2019 07:50

Áreas

Bacteriologia. Imunologia. Saúde Pública.

Bactérias da espécie Klebsiella pneumoniae estão entre os microrganismos que mais causam infecções hospitalares e também entre os que mais têm desenvolvido resistência a antibióticos nos últimos anos. Pertence ao grupo, por exemplo, a KPC (Klebsiella pneumoniae carbapenemase), que ganhou a alcunha de superbactéria por produzir uma enzima capaz de inativar os fármacos mais potentes disponíveis para o tratamento de infecções graves.

Um estudo recente apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e publicado na revista científica Journal of Global Antimicrobial Resistance mostrou que patógenos multirresistentes – inclusive as produtoras de KPC – já não são um problema restrito ao ambiente hospitalar no Brasil.

Ao analisar espécimes de K. pneumoniae isolados da urina de 48 pessoas diagnosticadas com infecção urinária na região de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, cientistas observaram que 29 amostras (60,4%) continham bactérias não suscetíveis a três ou mais classes de antibióticos e, portanto, consideradas multirresistentes (MDR). Em 30 amostras (62,5%), foram identificados 73 diferentes genes de virulência – codificadores de proteínas que ajudam o microrganismo a driblar o sistema imune ou a se disseminar mais facilmente no ambiente.

“Ficamos surpresos ao encontrar bactérias com tanta multirresistência e virulência em pessoas que não estavam hospitalizadas Algumas das bactérias analisadas tinham perfil genético caraterístico de cepas causadoras de infecção hospitalar”, disse à Agência FAPESP Dr. André Pitondo da Silva, professor da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP) e coautor do artigo.

O Dr. André Pitondo-Silva coordena um projeto que tem como objetivo comparar o perfil molecular de espécimes de Klebsiella isolados em pacientes de hospitais das cinco regiões brasileiras (Londrina, Brasília, Teresina, Manaus e Ribeirão Preto) e de países dos cinco continentes (Nova Zelândia, Canadá, Holanda, África do Sul e Índia). As amostras da comunidade ribeirão-pretana foram obtidas por acaso, quando os pesquisadores coletavam bactérias isoladas em pacientes de um hospital local. O trabalho teve início quando o Dr. André ainda era pesquisador da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP), da Universidade de São Paulo (USP).

“Nesse hospital parceiro, há um laboratório de análises clínicas particular que atende pessoas de diversos municípios do entorno, além de ser responsável pelos exames dos pacientes internados. Quando nos enviaram as amostras de K. pneumoniae, percebemos que nem todas tinham informações sobre a ala de internação. Ao questionarmos os funcionários do laboratório, fomos informados que as amostras eram de pessoas que não estavam hospitalizadas. Surgiu, então, o interesse de estudar essas bactérias da comunidade e compará-las com as do ambiente hospitalar”, contou o especialista

No estudo agora publicado, foram consideradas apenas as análises das 48 amostras dos pacientes não internados. Destes, 31,3% tinham mais de 60 anos, 27,1% tinham entre 30 e 59 anos, 14,6% eram jovens entre 16 e 29 anos e 12,5% eram crianças com idade entre 1 e 15 anos. Havia também um recém-nascido e outros seis pacientes sem idade identificada. Em relação ao sexo, 75% das amostras analisadas eram de mulheres.

Oportunismo

K. pneumoniae é considerada uma bactéria oportunista, ou seja, pode integrar a microbiota de um indivíduo durante anos, sem causar problemas. Porém, quando há queda na imunidade – em decorrência de uma doença, de um tratamento ou do envelhecimento – o microrganismo pode se manifestar de diversas formas – infecções pulmonares, urinárias, feridas (cirúrgicas ou escaras) e até mesmo sepse (infecção generalizada).

“No caso de pacientes com infecção urinária recorrente, o risco é o quadro evoluir para pielonefrite [doença inflamatória infecciosa que afeta os rins], podendo causar comprometimento renal e até mesmo sepse. Portanto, quando esses pacientes retornam ao hospital, podem disseminar no local os microrganismos multirresistentes”, disse o pesquisador.

A principal forma de contaminação é o contato com fluidos do paciente infectado, que pode ocorrer por meio de sondas e cateteres, por exemplo. “Quando bactérias MDR são identificadas em hospitais, principalmente as produtoras de KPC, são adotados protocolos rigorosos para evitar a disseminação, podendo até mesmo limitar a visitação ao paciente”, disse o Dr. André Pitondo-Silva.

Conhecer as características moleculares das bactérias encontradas nos hospitais de diferentes regiões do Brasil e do mundo ajuda a entender como os genes de resistência e virulência estão se disseminando e como a espécie está evoluindo, informação essencial para o controle de infecções e o tratamento correto dos pacientes.

“É muito importante investigar a quais antibióticos a bactéria é suscetível, pois administrar o medicamento errado pode até piorar o quadro clínico do paciente, selecionando as cepas mais resistentes”, realça o pesquisador.

Acesse o resumo do artigo científico (em inglês).

Acesse a notícia completa na página da Agência FAPESP.

Fonte: Karina Toledo, Agência FAPESP. Imagem: Dr. André Pitondo Silva.

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